sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Sim, Plório

        
        Coisa boa é descobrir coisas suas. Olhar para dentro e encontrar qualquer que seja uma referência, para quando necessário dizer com firmeza: "É porque sou/penso/faço assim, é meu jeito, isso é meu". Temos uma mania de manias, algo descomunal nos levando sempre ao encontro de uma falsa concretude, como se fossemos mesmo capazes de ser apenas um, com qualidades, mazelas e características imutáveis...
        Mas desconsiderar esse anseio nos deixa sem norte, como se a identidade tivesse mesmo que ser composta por números intransferíveis e a nós coubesse apenas a manutenção da exclusividade. Porque quando encontramos um pedaço desse caráter único, e ele se repete nos dando a momentânea sensação de auto conhecimento e controle, nos sentimos leve capazes, o espelho que nos reflete a nós mesmos fica límpido e nos mostramos mais fortes ao mundo e a si próprio.
        Hoje descobri algo.
        Na verdade esse algo já estava descoberto, mas dadas as circunstâncias do hoje ele se tornou mais evidente, pude perceber que é mesmo séria a forma com que se manifesta. Descobri que sou simples e gosto de coisas/pessoas/lugares simples. Não uma simplicidade qualquer, ou isenta de complexidades totais, mas a simplicidade que se refere a pequenice que somos perante o todo, que se encaminha a tão famosa "humildade", passando por aquele/aquilo que não teme o pouco porque se encontra nele, e em paz por isso. 
        Tomei consciência do quanto sou alheio às rebuscadas normas de comportamento e abordagem social, não que eu seja adepto de um anarquismo socio cultural, falo do tempo em que pessoas perdem escolhendo roupas e palavras, mentiras e roteiros prontos para apresentar uma autobiografia que se esvai quando estão só, ou quando estão diante de seus verdadeiros conhecedores. Tenho aversão aos assuntos que permeiam poucos ou não cabem os mais interessados. Sempre fomos acessíveis e possíveis, desde que nascemos, tornarmo-nos o contrário disso é negar-se a si mesmo. Não me acostumo com a necessidade padronizada de momentos certos para discussões óbvias, de consequências exatas para fatos ocasionais... Descobri hoje que a palavra "IMAGINA" deve ser bem empregada, porque ouvi: "imagino só, nem havia pensado",  "Ah imagina, que isso", "Pensa? você pode imaginar como fiquei" de formas tão fúteis e acrescidas de complementos ainda mais inúteis que cheguei a pensar: "Imagine eu!"
        Certamente reafirmei a mim o que Shakespeare expurgava ao dizer que "temos mais de nossos pais do que pensamos" e percebi além disso que tê-los em nós nos faz mais felizes, seja qual for a maneira com que seus pedaços construíram nossa estrutura, para mim, estar mais próximo desse todo me faz melhor, me faz sentir a firmeza humano do querer - por qualquer motivo que seja - manter-se assim, afirmando acima de tudo, que dentre as poucas certezas que temos, essa é uma delas.

(Rafael Lorran)

Amanhecer em Agridoce



Há quem amanheça em agridoce
Como se os pés pesassem
Mas os olhos insistissem
E se muito pensar é certeza que a cama aumenta
O chão desaba
E suspensos experimentamos os primeiros raios de sol
Há desejos porosos
Quando mergulhados na ansiedade
Ganham forma e pesam na consciência
Mas não duram na primeira pressão
Em agridoce as coisas existem
Não são decifráveis
Nem ao menos sequenciais
Mas dignas de causas e efeitos
Apáticas e transparentes
Presentes
Ainda na cama
Houve quem duvidasse
Quando de longe observava
Um nada em meu lugar
É Preciso igual apatia
Digna pra notar
Bem no início do dia
Uma gota de Mel
Sobre um pingo de Mar...

(Rafael Lorran)